O multilateralismo se apresenta em diversas faces, em temas políticos e econômicos, e o Brasil tende a negociar seus interesses de política externa atuando na conciliação de conflitos e nas questões mais urgentes da pauta internacional
Para John Gerard Ruggie, o termo multilateral é definido por sua dimensão qualitativa, em que os Estados conquistam benefícios equivalentes no decorrer do tempo, por meio de suas relações multilaterais.
Quando se fala em multilateralismo econômico ou político dos Estados, trata-se da questão das relações multidimensionais, ou seja: a partir de um propósito e interesses mútuos, os Estados se reúnem e fecham acordos e criam organizações favoráveis a seus objetivos.
Questões de segurança são um grande exemplo das relações multilaterais.
Após o fim da Segunda Guerra, a ONU (Organização das Nações Unidas) é criada no intuito de evitar novos conflitos, se tornando um órgão multilateral de alcance mundial. Institui-se o Conselho de Segurança Internacional, órgão permanente da ONU, que trata exclusivamente de assuntos relacionados à segurança.
Desde fevereiro de 2022 o sistema internacional vem passando por um momento crítico. A invasão da Rússia na Ucrânia criou inquietação na ordem mundial, que já se encontrava frágil após a pandemia de coronavírus. A guerra no leste europeu aumentou a crise econômica, comercial e política pelo mundo, sendo os dois Estados envolvidos grandes exportadores de cereais.
A Rússia, além disso, era grande exportadora de gás natural e de petróleo para a Europa, o que acabou afetando toda a cadeia comercial e, consequentemente, a economia do continente. Destaca-se ainda a crise energética em evidência, que leva a debates sobre energia limpa e seus avanços.
Desde o início da invasão russa, a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), uma organização criada pelo Ocidente para a proteção dos Estados membros, decide intervir e ajudar a Ucrânia, mas com interesses em aumentar o seu controle no leste europeu, trazendo consequências como uma possível guerra nuclear.
Em fevereiro de 2023, completou-se um ano de conflito sem que seja possível enxergar o fim desta guerra. A situação coloca em xeque a hegemonia estadunidense, o poder de veto e sansões criadas durante o período. Questiona-se se são realmente eficazes. A persistência do conflito só evidencia que não há eficácia nesse método e que a influência norte-americana não tem mais tanto poder quanto costumava ter.
Em caso de guerra, o multilateralismo entra como um possível “salvador”. Um exemplo é o encaminhamento da proposta brasileira à Rússia, tendo como base a criação de um grupo de países não envolvidos na guerra para articular uma mediação de paz. E isso só foi possível pelo fato de o atual governo brasileiro ter negado o envio de munição à Ucrânia, declarando-se neutro.
A Rússia analisou a proposta e Mikhail Galuzin, vice-chanceler russo, afirmou: “Notamos as declarações do presidente do Brasil sobre o tema de uma mediação para tentar encontrar meios políticos de evitar uma escalada na Ucrânia, corrigindo erros de cálculo no campo da segurança internacional com base no multilateralismo e considerando os interesses e todos os atores”, segundo publicou o jornal Folha de S. Paulo . Observa-se que mais uma vez o Brasil ganha espaço no sistema internacional numa arbitragem de confronto com a intenção de trazer a paz.
Não é a primeira vez que o Brasil age para ter mais protagonismo no sistema internacional. Como presidente da República, Fernando Collor de Mello (1990-1992) assumiu a missão de passar a imagem de um Brasil comprometido em se adequar às exigências internacionais de direitos humanos e de não proliferação de armas nucleares, como lembrou a professora Mariana Kalil no site da BBC.
Já nos governos de Fernando Henrique Cardoso (de 1995 a 2002), houve a preocupação em dar ao País um protagonismo internacional já visto décadas antes no mandato de Juscelino Kubitschek (1956-1961), quando o governo se via em posição de liderança dos países subdesenvolvidos. O Brasil havia tomado a frente após a Conferência de Bandung, na Indonésia, em 1955, que trouxe o tema dos problemas periféricos para a agenda da ONU e adotou pela primeira vez o termo Terceiro Mundo.
A OPA (Operação Pan-Americana), de 1958, trouxe, por sua vez, uma estreita relação de desenvolvimento econômico e segurança para a América Latina, que, por causa da guerra fria, se encontrava isolada dos interesses dos EUA.
Já no governo Lula 1 e 2 (entre 2003 e 2010), houve o destaque para avanços sociais, conforme lembrou a professora Mariana Kalil: “o Brasil começa a orquestrar em termos mais práticos o pleito por ampliar sua participação em organizações internacionais”. Sendo perceptível a atuação e necessidade do Brasil em ter voz no sistema internacional, dialogando com as potências sem deixar de lado o relacionamento Sul-Sul. Um exemplo é o Brasil manter relações com os EUA e China ao mesmo tempo.
O multilateralismo se apresenta em diversas faces, em temas políticos e econômicos, e o Brasil tende a negociar seus interesses de política externa atuando na conciliação de conflitos e nas questões mais urgentes da pauta internacional.
Na agenda de meio ambiente, a COP (Conferência da Biodiversidade da ONU) é um grande exemplo. Os Estados se juntam todos os anos para achar uma solução para a mudança climática, criando acordos e metas para os anos ou décadas seguintes, assim como conferências e acordos que ocorreram em anos anteriores de que é exemplo o Acordo de Paris.
Tendo então em vista a manutenção da paz e da ordem, o multilateralismo precisa ser exercitado e protegido, pois a cooperação entre Estados traz estabilidade para a ordem mundial, evitando conflitos desnecessários, sendo fundamental para um mundo multicultural.
Joyce Ambar é graduada em Relações Internacionais pela Universidade Anhembi Morumbi. Atualmente se especializando em diplomacia corporativa e compliance pela PUC Goiás.
Crédito da foto da página inicial: Loey Felipe/ONU
コメント