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Foto do escritorJoyce Ambar

Brancos comedores de terras

Atualizado: 21 de ago.

 

Desde 2018, a violência contra os povos indígenas se agravou, encoberta por um governo que apoiava a bancada rural e o garimpo ilegal. Espera-se que o atual possa reverter esse quadro, para que essas pessoas recuperem o direito de ir e vir, de viver em suas terras, de não serem abusadas de todas as formas inimagináveis

Em um mundo que se assiste diariamente pela televisão, pela Internet – reforça o sentido de que‘estamos todos no mesmo barco’ e, ao mesmo tempo, de que nesse ‘barco’ existem enormes diferenças em termos do que os seus ‘passageiros’ podem fazer para aproveitar a viagem e, também, para influir no rumo seguido; essas diferenças geram tensões que podem eclodir, seja em crises financeiras, seja em conflitos localizados (Luiz Felipe Lampreia, novembro 1998)

Há séculos povos originários vêm sendo expulsos de suas terras para dar espaço à agricultura, acomodar garimpos ilegais e, atualmente, para a privatização e exploração dessas terras por empresas multinacionais. Foi assim na África com a empresa Valle e é assim no Brasil com os indígenas desde o início da colonização portuguesa, quando foram jogados de lado e escravizados, sofrendo inúmeros abusos.


Mesmo com o passar dos tempos, com o avanço industrial e tecnológico, a violência contra o indígena ainda acontece, muitas vezes apoiada por governos corruptos, interessados em agradar suas bancadas e à elite produtiva. Governos que não se importam com a Constituição Brasileira de 1988, na qual o artigo 5º deixa claro que: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.


Além da quebra deste artigo da Constituição, há mais de quatro anos não se cumpre a obrigação de proteger a Floresta Amazônica e a Mata Atlântica contra o desmatamento criminoso.


O desmatamento na Amazônia teve um crescimento muito grande nos últimos anos, a despeito da agenda internacional que visa a frear o aquecimento global, e do fato de o Brasil participar de cúpulas do meio ambiente, como BASIC (Brasil, África do Sul, Índia e China), que realiza encontros anuais, além das agendas da ONU.


Ainda há grandes áreas desmatadas e queimadas durante o ano inteiro, mas isso não parece ser um problema para a ala política brasileira desde o fim do governo Lula 2. No ano passado, o Greenpeace publicou uma matéria sobre os focos de queimadas, mostrando a realidade do drama da região e que não vem sendo divulgado como deveria. Junto à degradação ambiental, há verdadeiros genocídios praticados em função dos interesses dos que promovem extração ilegal de madeira, dos garimpos ilegais, tráfico de drogas entre outros crimes.


Desde o começo do ano de 2023, com o governo Lula 3, começa a ficar aparente a marginalização dos povos ribeirinhos e indígenas no Norte do País. O garimpo ilegal funciona durante décadas na região trazendo um drama imenso para os moradores. Muitos, por não terem melhores oportunidades, são levados a sobreviver do garimpo e a aceitar facções criminosas na região. No caso dos indígenas, a sofrerem com violência sexual, escravidão, expropriação de terra e até inanição.


No começo do ano, foi denunciado o crime cometido contra o povo Yanomami, vítima do garimpo ilegal. Conforme uma matéria feita pela Amazônia Real, o genocídio dos Yanomamis vem acontecendo desde a época da ditadura, mas até então nunca foi levado à tona pela mídia. Em um trecho da matéria “Ouro do sangue Yanomami”, fica claro a ocorrência frequente da violência contra este povo: “O Brasil vive a sua quarta grande corrida do ouro ilegal no território indígena Yanomami. A primeira ocorreu nos anos 1970, patrocinada pelos militares e em plena ditadura. A segunda, nos primeiros anos da Nova República; e a terceira nos anos 1990 que resultou, em 1993, no assassinato de 16 Yanomami da aldeia Haximu, na Venezuela”.


Dos 23 garimpeiros acusados pelos massacres e extração ilegal de ouro, apenas cinco foram condenados pelo genocídio. Alguns daqueles criminosos operam hoje dentro do território indígena Yanomami, em solo brasileiro. Nesta atual corrida, intensificada desde 2019, já são mais de 26 mil garimpeiros invasores em Roraima, um Estado hostil aos direitos indígenas.


Um país em que desde o início de sua história a hostilidade com os povos indígenas foi sangrenta, não é de se espantar que tais violações dos direitos humanos ainda aconteçam, e sob o comando de criminosos que vieram do Sudeste do País para controlar a sua lavagem de recursos.


Segundo informa Clara Britto, da Amazônia Real, “em 2021, a espiral de violência que acompanha o garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami (TIY) atingiu um novo patamar. Em 10 de maio, a aldeia Palimiu, às margens do rio Uraricoera, foi atacada a tiros. No dia seguinte, seis policiais federais foram enviados à aldeia e recebidos a balas pelos criminosos. Mesmo com a presença do Exército e da Polícia Federal à TIY, houve ao menos 11 novos ataques a diferentes aldeias. As suspeitas recaem sobre garimpeiros ligados a uma das maiores organizações criminosas do país, o PCC (Primeiro Comando da Capital), que vem se aproximando do garimpo ilegal no Estado pelo menos desde 2018”.


Desde 2018, a violência vem se agravando, encoberta por um governo que apoiava a bancada rural e o garimpo ilegal, para o qual o indígena não tem direitos. Nesse período, a destruição dos órgãos nacionais para a proteção desses povos foi jogada às traças, dando lugar à exploração desenfreada.


Esse processo, contudo, vem sendo freado no governo atual, apesar de imensos obstáculos. Em entrevistas para os programas “Mano a Mano” e “Roda Viva”, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, detalhou as dificuldades encontradas para reestabelecer órgãos como a FUNAI, entre outros de proteção aos povos indígenas. Em uma das entrevistas, disse que, quando deputada federal, era fácil cobrar os órgãos responsáveis, mas que hoje, sendo ministra, entende a dificuldade e que o problema é “mais em baixo” do que aparentava ser.


Esse relato dos Yanomamis é apenas uma das inúmeras denúncias e problemas que vêm acontecendo no Norte do País. Urge cobrar do atual governo o enfrentamento da violência e da criminalidade, para que essas pessoas recuperem o direito de ir e vir, de viver em suas terras, sem por elas terem de lutar constantemente, de não serem abusados de todas as formas inimagináveis.


Espera-se comprometimento e perspicácia e que o Ministério dos Povos Indígenas, junto a outros setores do Executivo, possa ter força para mudar esse cenário.


Joyce Ambar é graduada em Relações Internacionais pela Universidade Anhembi Morumbi. Atualmente se especializando em diplomacia corporativa e compliance pela PUC Goiás.

Referências

PCC no poder do garimpo ilegal- https://amazoniareal.com.br/pcc-lavagem/

Entrevista Sonia Guajajara no Mano a Mano- https://open.spotify.com/episode/7qRBonJMS23dzGfSKGnwnj

Entrevista Sonia Guajajara no Roda Viva- https://www.youtube.com/watch?v=Bl2M6SREEsw

Crédito da foto da página inicial: Victor Moriyama/ISA.

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