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Por um ajuste justo do Banco Mundial

De tempos em tempos o Banco Mundial lança relatório sobre o desenvolvimento social de algum país no mundo. Em quase todas as suas análises a busca é sempre a mesma: a eficiência. No Brasil, a sua mais recente publicação, feita sob encomenda do próprio governo brasileiro – “Um Ajuste Justo: análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil” – teve o mesmo objetivo. No qual, a principal conclusão foi que os gastos públicos são elevados, ineficientes e injustos.

Em que pese todo esforço analítico da instituição, o seu principal achado não é nenhuma novidade para o que já vem sendo analisado pelos principais centros de pesquisa do país, e inclusive do Estado por meio do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), além de outros diagnósticos já amplamente conhecidos.

“O principal achado de nossa análise é que alguns programas governamentais beneficiam os ricos mais do que os pobres” (Banco Mundial, página 1).

De toda forma, no geral, o relatório do Banco Mundial parece não se ajustar à realidade brasileira, ou não entendê-la em seus traços mais gerais, em especial no que diz respeito ao processo democrático de decisão popular. Ao negligenciar o contexto democrático de criação das políticas sociais expressas na Constituição Federal de 1988 (CF 88), o Banco Mundial ignorou a principal raiz das supostas “ineficiências” do gasto público.

Não foram analisadas as premissas financeiras e constitucionais que dão sustentação ao desenvolvimento das políticas. O que acaba causando estranheza, haja visto que a instituição é um Banco e não analisa a fundo o aspecto financeiro vicioso das Desvinculações das Receitas da União (DRU) – que retira recursos da previdência, saúde e assistência social – sobre as políticas públicas.

Em segundo, parece haver uma extrema generalização analítica dos setores analisados – funcionalismo público, planejamento e licitação, previdência, assistência social, saúde e educação – que negligencia as especificidades de cada área. Na saúde, por exemplo, quando o estudo sugere o fechamento de hospitais de pequeno porte por hospitais maiores em favor dos ganhos de escala, a avaliação desconhece um aspecto geográfico básico do país: o Brasil é uma nação continental com 8,5 milhões de quilômetros quadrados.

Logo, nesse sentido, com vistas a garantir o direito à vida, o SUS com certeza vai operar abaixo da escala “ótima” em regiões mais isoladas do país, mas de forma planejada para assegurar a sustentabilidade dos cuidados em saúde. Ou seja, o que é uma ineficiência para o Banco Mundial, no sistema de saúde se traduz em direito à vida, que,diga-se de passagem, já estava prevista na política regional de saúde da Constituição Federal de 1988, e foi aperfeiçoada recentemente pela Portaria de nº 399, de 22 de fevereiro de 2006 .

Por fim, para um relatório tão categórico em afirmar resultados monetários e sugerir políticas públicas, a ausência do anexo metodológico é gravíssimo. Isto porque, na literatura, existem várias formas de se calcular a eficiência, e a primeira pergunta que fica ao pesquisador é: será que o Banco Mundial utilizou todas as variáveis relevantes?

Todavia, ao longo do relatório, há uma evidência de que o documento trabalhou com o modelo de Análise Envoltória de Dados – Data Envelopment Analysis (DEA) – como forma de estimar as eficiências dos gastos. A informação é importante, dado que já existem no Brasil publicações com o uso do DEA. A mais importante dentre elas é do IPEA sobre a “Avaliação de eficiência em sistemas de saúde: Brasil, América Latina, Caribe e OCDE” .

Chama atenção que, já na sinopse do trabalho, os autores advertem: o modelo não permite afirmações categóricas sobre os sistemas de saúde, visto que a posição relativa do sistema varia bastante em função da análise, das variáveis consideradas, e da amostra utilizada para estimar os resultados.

Contudo, enquanto o anexo metodológico não surgir, o estudo estará em permanente suspeição de viés analítico.

Crédito da foto da página inicial: José Cruz/Agência Brasil

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