Bilhões serão gastos no Túnel Santos-Guarujá e na terceira pista da Rodovia dos Imigrantes: insistência em dar prioridade ao transporte por rodovias, e, pior, ao uso do automóvel individual, em vez de projetos ferroviários e de transporte público
De acordo com informações do Governo do Estado de São Paulo, já foram iniciados os estudos para a construção de uma terceira pista da Rodovia dos Imigrantes, que liga a capital ao litoral, e ao maior porto da América Latina, o de Santos. No litoral, por sua vez, a construção de um túnel entre Santos e Guarujá está entre as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Governo Federal.
Ambos os projetos insistem no velho erro: o de privilegiar o rodoviarismo. Só no Túnel Santos-Guarujá serão R$ 6 bilhões. A terceira pista da Imigrantes certamente vai custar cifras na casa dos bilhões também. Uma fortuna a ser gasta com soluções cujos resultados duram pouco, mas os efeitos colaterais são para sempre: congestionamentos, poluição e outros impactos socioambientais.
Será que de parte das autoridades falta esse conhecimento? É provável que não. Ocorre que possivelmente falam mais alto os interesses econômicos, das empreiteiras e grandes construtoras, ávidas pelo retorno financeiro imediato. A construção, custeada pelos cofres públicos, depois a concessão, com receitas para a iniciativa privada, são uma fórmula e tanto para se ganhar dinheiro.
No lugar da terceira pista da Imigrantes, por que não um ramal ferroviário de mão dupla, para o tráfego de trem de passageiros e de locomotivas de carga? De fato é um projeto mais caro, mais meticuloso, contudo com efeitos bem menos daninhos: tiraremos caminhões da estrada, que poluem e aumentam risco de acidentes, e substituiremos o estímulo ao transporte individual pelo incentivo ao coletivo, bem mais sustentável.
O Túnel Santos-Guarujá, no ponto em que está sendo projetado, tem todos os indícios de ser uma furada, igualmente.
Se for para resolver o problema de mobilidade urbana metropolitana, equívoco dos graves: a fortuna poderia ser aplicada em uma rede de transporte hidroviário integrado (inclusive na tarifa) com outros modais, como ônibus e VLT, de eficácia muito mais evidente e conhecida do que pistas para tráfego de automóvel.
Se for para a logística portuária, o Túnel Santos-Guarujá, onde será escavado, pouco serve. Vai obrigar caminhões e outros veículos a trafegarem por zona adensada por residências, comércio, complicando o trânsito e levando poluição aos bairros atingidos.
Além disso, o túnel, submerso no estuário, corre o risco de ele ficar submerso pela elevação das águas do oceano. No ano passado, um estudo da Organização das Nações Unidas (ONU) amplamente divulgado informou que, no Brasil, cidades como Santos e Rio de Janeiro correm o risco de ter áreas inundadas, até 2050, pela água do mar.
Como isso não está sendo levado em conta? O transbordamento recente do Guaíba e da Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul, desalojando e desabrigando famílias, causando mortes, como vimos há pouco, não serve de alerta?
Wagner de Alcântara Aragão é jornalista e professor. Mestre em estudos de linguagens. Licenciado em geografia. Bacharel em comunicação. Mantém e edita a Rede Macuco.
Crédito da foto da página inicial: Agência Metropolitana da Baixada Santista (Divulgação) Imagem em destaque: vista área das duas pistas da Imigrantes, na Serra do Mar.
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