Com a ascensão do neoliberalismo iniciada na década de 1980, os Estados passaram por diversas transformações na forma de atuação, com objetivo de intervenção mínima do Estado. No Brasil, com a forte atuação do Estado na economia no século 20, particularmente da década de 1930 até 1980, o país reformulou a sua atuação com diversas formas de restrições com objetivo de equilíbrio nas contas públicas e intervenção mínima do Estado.
Apesar do afrouxamento de algumas políticas econômicas em meados da década de 2000 até meados da década de 2010, as políticas econômicas continuaram seguindo o denominado tripé macroeconômico, que contempla o resultado primário, câmbio flutuante e meta de inflação. Essas políticas criaram restrições para a atuação do Estado em busca de um desenvolvimento socioeconômico pleno.
Com a crise econômica, política e social iniciada no Brasil em 2014, o debate se fixou no orçamento do governo como foco do problema. Como solução, ocorre a indicação de políticas econômicas de austeridade fiscal, como iniciado pelo governo Dilma em 2015 com corte de gastos e intensificado com o governo Temer com a Emenda Constitucional 95 (“Teto dos Gastos”), que congela por 20 anos as despesas públicas primárias federal, com algumas exceções.
O discurso, com base na austeridade fiscal, de que o Estado quebrou ainda é forte. Porém, com a pandemia do COVID-19, diversos economistas, inclusive aqueles que lideraram a ideia que o “Estado quebrou”, estão discutindo a importância do Estado na atuação da coronacrise. Seguindo a aplicação de políticas econômicas adotadas em âmbito internacional no enfrentamento da coronacrise, o discurso se unifica em formas que o governo pode atuar com objetivo de amenizar os impactos econômicos e sociais da pandemia.
Até agora, as políticas de austeridade não funcionaram para os objetivos de melhorar a dinâmica do crescimento econômico, emprego de qualidade, distribuição de renda equitativa e não alcançaram equilíbrio fiscal. É relevante lembrar que o Estado tem diversas funções clássicas numa sociedade, seja pela sua função alocativa, distributiva e estabilizadora, ou seja, o Estado tem como uma de suas funções fomentar a distribuição de renda com justiça social.
No mundo e no Brasil, já há previsões de uma crise econômica forte. Nesse caso, a atuação do Estado dos diversos países deve se intensificar. As preocupações orçamentárias nesse momento devem ser totalmente abandonadas, pois as políticas econômicas precisam garantir a melhor harmonia possível da sociedade, inclusive garantindo os direitos sociais segundo Pactos internacionais de que o Brasil é signatário, como o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) e a Constituição Federal de 1988.
Esses direitos visam a garantir uma vida digna para a população que abrange o acesso a saúde, moraria, emprego e educação dentre outros. Além de serem direitos que não devem ser em hipótese nenhuma violados, os impactos econômicos desses gastos sociais são importantes para a retomada da economia no pós-pandemia.
Ponto importante para orientar o Brasil no durante e no pós-pandemia é a pesquisa científica. No Brasil, de meados da década de 2000 para meados da década de 2010, ocorreu um fortalecimento das universidades públicas e ampliação das políticas voltadas para o ensino superior. Os programas de pós-graduação e as pesquisas foram elevados a um novo patamar, assim como a contemplação de todas as áreas de conhecimento criaram um horizonte consistente de qualificação de pesquisadores, ainda que esse número seja uma proporção pequena. Essa realidade sofreu mudanças abruptas desde 2015 com a sincronia de escassez de recursos e desmantelamento da estrutura existente. O desmonte ficou mais evidente a partir das ações do governo atual.
A nova lógica está muito distante da necessária para dar continuidade a expansão das vagas e bolsas nos Programas de Pós Graduação (PPGs). O governo, a partir de uma visão de enxugamento do Estado, entende que os gastos com pagamento de bolsas para os pesquisadores não são prioridade. Nesse enredo, do que é prioridade ou não, a Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (CAPES) saiu reformulando, através de várias portarias, as políticas de concessão de bolsas aos Programas de Pós-Graduação do país. Agora, considera-se como critério – supostamente – a nota do Programa, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do município e índices relacionados ao cumprimento de prazos de formação.
Não bastasse esse cenário caótico do Brasil, por meio da Portaria 34 e de forma autônoma, a mesma instituição desrespeitou a política de concessão já acertada com os PPGs e, ao reduzir o financiamento, centenas de programas do país perderam bolsas e reduziram a sua capacidade de conduzir pesquisas em andamento e de captar novos pesquisadores.
A pesquisa em economia é uma das áreas afetadas pela citada portaria. Cabe ressaltar que as pesquisas em economia são primordiais para o enfrentamento da pandemia, na busca de analisar os impactos econômicos e sociais e propor medidas adequadas para o enfrentamento da coronacrise. Refletir sobre a estrutura econômica, política e social e indicar alterações são trabalhos relevantes com as ferramentas dos economistas, já que, pós-pandemia as pesquisas desses profissionais são essenciais para a retomada do crescimento econômico com distribuição de renda e justiça social depois do caos da crise sanitária.
Nesse cenário, com a necessidade de atuação forte em várias frentes, a pesquisa é subestimada pelo governo como uma forma de atuação no combate à coronacrise. Os cortes de bolsas de pesquisa, essenciais para a manutenção das pesquisas em diversas áreas essenciais para o enfrentamento da pandemia e no pós-pandemia, são evidência do não comprometimento com a pesquisa pelo governo federal.
Crédito da foto da página inicial: Universidade Federal de Goiás
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